sábado, 7 de julho de 2012

Nossa Senhora da Conceição

Bispos da Amazônia 10º Encontro

Santarém segunda-feira, 02 de julho, 10º Encontro dos Bispos da Amazônia. O evento  reúne cerca de 40 bispos dos estados do Pará, Amapá, Amazonas, Rondônia, Roraima, Acre, Mato Grosso, Maranhão, Rio Grande do Norte, além dos coordenadores de pastoral, leigos e religiosas das Dioceses e das prelazias desses Estados.
O Secretário Geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner, e o presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia, Dom Claudio Hummes também presentes no encontro.
 Na avaliação do padre Luiz Pinto, administrador da Diocese de Santarém, o encontro é uma oportunidade para retomar, rever e reviver o encontro, que há 40 anos, elaborou as diretrizes pastorais para a Igreja da Amazônia. “Para toda a Amazônia, é importante que reveja a caminhada, o caminho que foi traçado, aquilo que foi realizado, e procuremos agora acertar o passo novamente”.
Segundo declarou padre Luiz Pinto, “a historia das linhas prioritárias para a pastoral da Amazônia teve seu inicio por ocasião da reunião realizada no Rio de Janeiro, em 1971, quando os bispos dos regionais Norte I e II reuniram-se para pensar uma ação pastoral conjunta para a Amazônia. Era época da ditadura militar, época difícil e sofrida, quando o trabalho de evangelização exigia sensibilidade para bem discernir os sinais dos tempos diante das novas frentes abertas pelas iniciativas dos assim chamados grandes projetos (Jari, Carajás, Trombetas, Transamazônica, Hidrelétricas do Curuá-Una, Balbina, Tucuruí, entre outros).
                 Celebração eucarística às 18 horas, na Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição.

A celebração foi presidida pelo arcebispo de Belém, Dom Alberto Corrêa Taveira, e co-celebrada pelos demais bispos dos Regionais Norte 1, Norte 2 e Noroeste da CNBB.
Dom Esmeraldo, arcebispo de Porto Velho,  um dos coordenadores do encontro, deixou como mensagem inicial, a leitura dos Atos dos Apóstolos, quando Pedro vai visitar a família de Cornélio.
Logo após os bispos seguiram para o Seminário São Pio X, onde aconteceu  as 19h30 o Jantar e a acolhida aos participantes pela Comissão Episcopal da Amazônia.
Em suas primeiras palavras, o presidente da Comissão Episcopal para Amazônia, Cardeal Dom Cláudio Hummes, manifestou apoio da Comissão aos seus irmãos do episcopado da Amazônia e ressaltou que a palavra chave neste encontro é “confiar na ação do Espírito Santo que as luzes virão”. E concluiu: “Estou aqui mais para ouvir, aprender e admirar o trabalho da Igreja nesta imensa região”.

Dia 03 de julho               TERÇA FEIRA

Os bispos da Amazônia,  iniciaram o segundo dia do 10º Encontro com celebração eucarística na capela do Seminário São Pio X.
Presidida por Dom Luiz Soares Vieira, arcebispo de Manaus, a celebração destacou a vida da caminhada pastoral nas práticas das comunidades de base que muito contribuíram para os movimentos sociais.
Houve destaque para o testemunho de Dom Moacir Crecchi, arcebispo emérito de Porto Velho, considerado uma das vozes proféticas na Amazônia.

Destacando o entendimento que antes se tinha sobre a missão, Dom Moacir disse o seguinte: “Nós tínhamos a sensação que éramos terra de missão e os missionários deviam vir de fora para nos ajudar. Não tínhamos a ideia de que nós também somos missionários e que devemos colaborar com a missão no mundo inteiro”.

Considerando o documento de Santarém, elaborado há 40 anos, o arcebispo emérito de Porto Velho destacou que “Foi aqui que surgiu nossas quatro primeiras prioridades que depois foram migrando para a Igreja em todo o Brasil”, representando um marco para a igreja no país.

Após a celebração, os bispos iniciaram os trabalhos, primeiro fazendo uma retrospectiva do Documento de Santarém, e em seguida a análise de conjuntura da região, discutindo sobre a realidade socioeconômica da Amazônia.

Os trabalhos desta manhã continuam até o meio dia. Às 14h os coordenadores do encontro vão atender à imprensa em uma entrevista coletiva.


O assunto principal da primeira coletiva oficial concedida à imprensa na tarde desta terça-feira, 03, no Seminário São Pio X, foi os problemas enfrentados  pelas populações da Amazônia com os grandes projetos, que além de causarem grande impacto ao meio ambiente, geram lucros para alguns e provocam inúmeros impactos sociais negativos nas cidades onde estão instalados.

A entrevista foi concedida por Dom Jesus Maria Berdonces, bispo da prelazia de Cametá e presidente do Regional Norte I; Dom Mosé João Pontelo, bispo da Diocese de Cruzeiro do Sul e presidente do regional Noroeste; Dom Roque Paloschi, bispo da Diocese de Roraima e presidente do Regional Norte 1 e Monsenhor Raimundo Possidônio, coordenador de Pastoral da Arquidiocese de Belém e historiador.

Dom Jesus Maria Berdonces afirmou que a Amazônia é tida até hoje como uma colônia, aonde as pessoas vêm, pegam a matéria prima, enriquecem e vão embora. “Esse é um modelo capitalista pautado pelo governo para a Amazônia, que não leva em conta o povo que aqui mora. “A igreja defende o incentivo à agricultura familiar, defende que os lucros das riquezas (minerais e vegetais) sejam deixados na Amazônia, e que os povos sejam ouvidos”.

Dom Roque Paloschi destacou que a questão é saber quem está usufruindo dos lucros desses grandes projetos, que além de terem as bênçãos do governo, são financiados com o dinheiro público.
Dom Roque defende o respeito à biodiversidade, a participação de homens e mulheres amazônidas, que possuem a sabedoria milenar e tradicional de cuidar do meio ambiente sem agredi-lo. Ele espera que o encontro de Santarém provoque uma verdadeira reflexão.
Dom Mosé João Pontelo afirma que os problemas estão aí, e isso requer responsabilidade dos pastores, que são lideres dessa igreja.
Dom Jesus Maria acredita que os bispos têm a obrigação de tentar iluminar a caminhada com a Palavra de Deus, mas também assumir o desafio e o povo da Amazônia.


Dia 04 de julho                  QUARTA FEIRA

Nesta manhã, (04), na celebração Eucarística do, Dom Erwim Kräutler, bispo do Xingu, deu seu testemunho de vida e atuação na Amazônia.
 “A Igreja tem a missão de anunciar e comunicar o amor de Deus a todo o ser humano e a todos os povos. Eu me inclino diante de mulheres e homens que com sua mística baseada na meditação e na Palavra de Deus deram sua vida, mesmo correndo o risco de perdê-la, por causa do Evangelho”. E por fim, com firmeza e serenidade, fez suas as palavras do texto bíblico da carta aos Romanos, capítulo 8:
“Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, a angústia, a perseguição, a fome, a nudez, os perigos, a espada? Em tudo isso somos mais que vencedores graças Àquele que nos amou. Estou convencido que nem morte, nem a vida, nem anjos, nem principados, nem o presente, nem o futuro, nem poderes, nem altura, nem profundidade, nem nenhuma outra criatura nos pode separar do amor de Deus, manifestado  em Jesus Cristo Senhor nosso. Amém!, concluiu o bispo.
E em uma só voz a Igreja presente cantou: “Quem nos separará, quem vai nos separar do amor de Cristo, se Ele é por nós, quem será contra nós? Quem vai nos separar do amor de Cristo?
A prefeita de Santarém, Maria do Carmo Martins, esteve na tarde de hoje, 04 de julho, com os participantes do 10º Encontro dos bispos da Amazônia.
Ao fazer seu pronunciamento, destacou que refletir a Amazônia é muito importante. E se há 40 anos, o papa Paulo VI, dizia que “Cristo apontava para Amazônia”, é necessário reunir para identificar o que a região ganhou ao longo desses anos.
Para a prefeita de Santarém, Maria do Carmo Martins,  refletir a Amazônia não é fácil. “Aqui na Amazônia tudo é superlativo. As distâncias são grandes, a população é muito sofrida, mas ao mesmo tempo engajada, organizada e sabe o que quer. É um povo que tem uma grande fé em Deus, mas também acredita no futuro ao tentar respeitar a questão ambiental, e tudo isso deve ser levado em consideração na hora de uma reflexão. E eu tenho certeza de que, quem ganha com este encontro não é só a Amazônia, é o Brasil inteiro”, finalizou.

Dia 05 de julho            QUINTA FEIRA

Dom Leonardo Steiner, secretário geral da CNBB, em sua saudação aos participantes do encontro, destacou que é sempre bom, numa conferência tão grande poder olhar e dizer que os leigos, os padres e os bispos da Amazônia ajudam a dar testemunho vivo do Evangelho, sendo presença pobre, simples, generosa e gratuita de Deus no meio dos povos desta região. São pessoas que vieram anunciar a boa nova com amor e dar testemunho de vida.
Destacou que as experiências missionárias realizadas na Amazônia precisam ser levadas adiante e multiplicadas, para que no futuro mais pessoas estejam disponíveis a realizar o trabalho na região. “O nosso espírito missionário na igreja no Brasil ainda precisa crescer muito. Lembrou ainda que “a igreja da Amazônia precisa de muita gente; homens e mulheres, que realmente estejam dispostos a dar à vida pelos irmãos; e para isso é preciso uma liberdade evangélica de vir e servir”.
Agradeceu a oportunidade de estar participando de um encontro tão importante para Igreja na Amazônia, de onde sairão propostas para um trabalho cada vez mais profético.

Irmã Henriqueta Cavalcante, coordenadora da CJP do Regional norte 2, que tem realizado um trabalho incansável de denúncia crimes de  violência sexual contra crianças e adolescentes e o tráfico de mulheres  crescentes nos Estados do Pará e Amapá e  cobra punição aos envolvidos nesses crimes, a Comissão de Justiça e Paz (CJP). Ela é uma das religiosas que participa do 10º Encontro da Igreja da Amazônia em Santarém, e que entendeu perfeitamente o eixo central do documento que é encarnar na realidade da Amazônia.
A religiosa acredita que hoje só é possível encarnar na realidade quem realmente assume o projeto de Deus, que é defender a vida das pessoas.
“Esse tem sido o nosso esforço dentro da Comissão de Justiça e Paz. E eu, como mulher consagrada, vivo integramente, 24 por dia em prol da defesa da vida, principalmente  daqueles e daquelas, que nos procuram e clamam por justiça, já que nós também vivemos num Estado marcado pela cultura da impunidade, onde a justiça só acontece para uma minoria”, finalizou.
Por conta de seu trabalho, irmã Henriqueta Cavalcante está ameaçada. Mas quem pensa que esse foi um motivo para sua desistência, se engana. Ela afirma que tem muita clareza da opção que fez.
Em tom de Coragem e firmeza, a religiosa afirma: “Eu fiz uma opção pela vida religiosa, eu fiz opção de colocar a minha vida toda à serviço do reino de Deus, e hoje nada mais me faz desistir dessa luta.

Cheia de esperança para com a caminhada da Igreja, Irmã Maria Mendes, religiosa natural do Estado de Rondônia, representa a CRB nacional no 10º Encontro dos Bispos da Amazônia, em Santarém/PA. Para ela, celebrar 40 anos do Documento de Santarém é atualizá-lo frente aos desafios que a região e o mundo enfrentam no contexto atual.
Ela destaca que a CRB sempre tem caminhado em sintonia  e parceria com a CNBB, ouvindo o que os bispos tem a dizer sob o impulso do Espírito de Cristo para assumir os desafios desta imensa região cheia de desafios a serem superados com fé, esperança e caridade.
A irmã acredita que “em seu projeto intercongregacional, a CRB se faz presente aqui para ouvir, para escutar, quais são os desafios e as esperanças do povo, para que juntos aos pastores do povo de Deus se possa fazer e trilhar o caminho eclesial”, um caminho que mantenha clara a evangélica opção preferencial pelo empobrecidos e marginalizados, quando todos e todas assumem o compromisso de Jesus: a construção do Reino de Deus entre nós.

      Cultura santarena é apresentada aos participantes do 10º encontro
Decantando as belezas naturais de Santarém (PA), o cantor e cardiologista, João Otaviano, abriu o momento cultural do 10º Encontro da Igreja na Amazônia.  A música “canção da minha saudade” foi a primeira ouvida pelo anfitrião do encontro dos bispos em 1972, Dom Tiago Ryan, ao chegar a Santarém, em 1943.

Os participantes do encontro tiveram a oportunidade de ouvir canções da cidade e apreciar a apresentação dos jovens do grupo “Bailado de Carimbó”, da Paroquia de Nossa Senhora do Rosário, no bairro do Santarenzinho. O grupo trabalha com jovens em situação de risco e é acompanhado pela Congregação do Verbo Divino.

Para fechar a noite, a cantora santarena, Cristina Caetano, no ritmo do carimbó, apresentou através da música “Esse rio é minha rua”,  uma das realidades amazônicas: o uso do rio como meio de ida e vinda entre as cidades.

No final houve sorteios e os bispos receberam um exemplar do livro “O Missionário do Tapajós”, comemorativo ao centenário de nascimento de Dom Tiago Ryan.

Dia 06 de julho                 SEXTA FEIRA

Bispos da Amazônia reafirmam compromisso e opção pelos pobres.
Compromisso e opção pelos pobres. Esse é um dos principais resultados do 10º Encontro da Amazônia em Santarém, anunciado previamente durante entrevista coletiva na tarde desta sexta-feira, no seminário São Pio X.
Participaram da coletiva, Dom Cláudio Hummes, da Comissão Episcopal para a Amazônia, Dom Leonardo Steiner, secretario geral da CNBB, Dom Esmeraldo de Farias, arcebispo de Rondônia e Pe. Luiz Pinto, administrador da Diocese de Santarém.
Além da opção pelos pobres, os bispos destacaram que durante o encontro, foi reafirmado o compromisso de realizar um trabalho evangelizador, missionário, samaritano de todos os batizados.
Destacaram ainda a preocupação com a formação de padres, religiosos (as) leigos(as) para que aprofundem ainda mais a sua experiência de vivencia cristã.
Segundo Dom Esmeraldo de Farias, as  comunidades precisam ficar não só agir naquilo que é necessário para a própria comunidade, mas abrindo–se ao trabalho, seja no campo eclesial, de ajudar na evangelização da catequese, mas também no campo social.
Pretendem continuar buscando o diálogo com os governantes, pois sentem a ausência do Estado. Eles reforçam a necessidade de uma presença mais efetiva, sobretudo na promoção da vida, combatendo à violência, o tráfico e uso de drogas, e o trabalho escravo.
Necessidade de fortalecimento das Comunidades Eclesiais de Base. Dom Cláudio lembrou que as CEBs foram, durante décadas, a grande força de resistência contra toda forma de opressão. “se queremos de fato trazer as pessoas a Jesus Cristo, temos que ajudá-las a vivenciar sua fé numa comunidade, pois ninguém faz o caminho sozinho para Deus”.
O documento final, 19h30, na Igreja do Santíssimo Sacramento.
Cerca de 1.200 pessoas lotaram a igreja do Santíssimo Sacramento, em Santarém (PA), no encerramento do 10º Encontro dos Bispos da Amazônia, que celebrou os 40 anos do Documento de Santarém. Os bispos reafirmaram na celebração a tônica do documento que ratifica o compromisso da Igreja com os povos da Amazônia e a defesa da ecologia.
“A Amazônia continua sendo um apelo à Igreja, um lugar permanente de missão”, sentenciou Dom Cláudio Hummes, cardeal presidente da Comissão Episcopal para a Amazônia que presidiu a celebração. Segundo ele, a região, por suas características próprias, requer uma atitude profética da Igreja, sobretudo considerando que estas terras sempre foram vistas como uma fonte de riquezas exploradas continuamente.
O profetismo, disse o cardeal, exige atitudes que estão relacionadas à promoção humana. “A promoção humana faz parte da evangelização e para que isso aconteça é necessário combater toda forma de opressão sobre o povo”.
A celebração teve um tom festivo, com elementos simbólicos evidenciando as características da região, pelo desfecho do evento histórico.
O documento firmado pelos bispos 40 anos atrás, via profeticamente o que viria a acontecer no futuro próximo. A visão da igreja da época veio a se consolidar com a exploração da Amazônia e de seus povos.
O documento final do 10º encontro dos Bispos – no formato de carta ao povo – foi lido na celebração pelo arcebispo de Manaus, Dom Luís Soares Vieira, destacando o compromisso missionário, profético e com os povos da região. O documento oficial será publicado posteriormente.
Carta dos bispos ao Povo de Deus, na íntegra.
Irmãs e irmãos caríssimos em Cristo Jesus; Povo de Deus na Amazônia,
“Não tenha medo, cotinue a falar e não se cale, pois eu estou contigo“ (At 18,9)
“Cristo aponta para a Amazônia“ lembrava o Papa Paulo VI aos bispos da Amazônia por ocasião de seu encontro em Santarém, de 24 a 30 de maio de 1972, marco indelével na história da Igreja desta grande região brasileira, habitada por povos de culturas e tradições tão diferenciadas do outro Brasil.
Expressamos nossa gratidão ao Deus da vida porque nestes 40 anos, não obstante nossas fragilidades, nossa Igreja tem anunciado Jesus Cristo ressuscitado, caminho, verdade e vida e tem marcado presença junto ao povo sofrido, sendo muitas vezes a voz dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, seringueiros e migrantes, nas periferias e em novos ambientes do centros urbanos animando as comunidades na reivindicação do respeito pela sua história e religiosidade. É também a vida destes povos, seu modo de viver, sua simplicidade, seu protagonismo, sua fé que nos encantam! Não faltou o testemunho de entrega da própria vida até o derramamento de sangue. Este testemunho nos anima, nos encoraja e nos fortalece. São também protagonistas religiosos e religiosas, pastorais, movimentos e serviços que tem sido uma força viva e atuante na realidade das nossas comunidades.
            Constatamos avanços no campo social e político, com novos organismos de participação, conselhos de políticas públicas, participação nas campanhas por leis mais justas, aumento da consciência e engajamento na questão ecológica. No campo econômico, cresce o consumo e o poder aquisitvo embora nem sempre acompanhado do aumento da qualidade de vida. A vida na Amazônia continua sofrida.
Há séculos os povos da Amazônia gemem e choram sob o peso de um modelo de desenvolvimento que os oprime e exclui do “banquete da vida, para o qual todos os homens e mulheres são igualmente convidados por Deus“ (SRS 39). A Igreja ouve os gritos, às vezes desesperados, e se identifica com o seu clamor, conhece o seu sofrimento. Mais ainda, a Igreja declara que “as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos homens e mulheres, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e angustias dos discípulos de Cristo“ (cf. GS 1).
As decisões sobre o desenvolvimento da Amazônia sempre são tomadas a partir de fora e visam unica e exclusivamente a exploração das riquezas naturais sem levar em conta as legítimas aspirações dos povos desta região a uma verdadeira justiça social. Quando Paulo VI declarava que “o desenvolvimento é o novo nome da paz“ (PP 87), não pensava num “crescimentismo“ meramente econômico, unilateral e excludente, mas convidava a todos os povos da terra a empenhar-se por um mundo justo, fraterno e solidário, na perspectiva do Reino que Jesus veio a anunciar “para que todos tenham vida“ (Jo 10,10).
Como quarenta anos atrás, a Amazônia continua sendo considerada a “colônia“, mesmo que abranja mais da metade do território nacional. Para a metrópole – Brasília, o sudeste e o sul do País – Amazônia é apenas “província“, primeiro província madeireira e mineradora, depois a última fronteira agrícola no intuito de expandir o agronegócio até os confins deste delicado e complexo ecossistema, único em todo o planeta. De uns anos para cá a “província“ recebeu mais um rótulo, sem dúvida o mais desastroso, pois implicará a sua destruição programada, haja visto o número de hidrelétricas projetadas para os próximos anos: a Amazônia é declarada a província “energética“ do País. Sob a alegação de gerar energia limpa se esconde a verdade de que mais florestas sucumbirão, mais áreas, inclusive urbanas, serão inundadas, milhares de famílias serão expulsas de suas terras ancestrais, mais aldeias indígenas diretamente afetadas, mais lagos artificiais, podres e mortos, produzirão gases letais e se tornarão viveiro propício para todo tipo de pragas e geradores de doenças endêmicas.
A história da Amazônia revela que foi sempre uma minoria que lucrava às custas da pobreza da maioria e da depredação inescrupulosa das riquezas naturais da região, dádiva divina para os povos que aqui vivem há milênios e os migrantes que chegaram ao longo dos séculos passados.
Santarém 1972: Encarnação na Realidade e Evangelização Libertadora
Como já em 1972, os bispos reunidos em Santarém de 2 a 6 de julho de 2012 não detectam apenas os mecanismos perniciosos responsáveis pela miséria dos povos e a devastação das florestas, mas os denunciam como responsáveis de gerar “ricos cada vez mais ricos às custas e pobres cada vez mais pobres“ (João Paulo II, Discurso inaugural de Puebla, 28 de janeiro de 1979) e de um meio-ambiente cada vez mais deteriorado. O “lar“ (em grego “oikos“ – daí a palavra “ecologia“) que Deus criou para todos nós não pode ser explorado até a exaustão, mas exige cuidado, zelo, amor, também em vista das futuras gerações. Os cientistas alertam sempre mais que a devastação da Amazônia terá consequências irreversíveis para o clima do planeta e se torna assim uma ameaça à vida e sobrevivência de toda a humanidade.
Em 1972 os bispos da Amazônia já identificaram graves feridas neste mundo de selvas e águas que atingiram violentamente os povos originários e tradicionais da região. Como 40 anos atrás, também hoje os bispos se entendem como mensageiros dos povos da Amazônia, profetas que vivem numa grande proximidade com Deus e ao mesmo tempo sintonizados com os acontecimentos históricos, homens de fé que „vêm da grande tribulação“ (Ap 7,14). Nestes nossos tempos, as feridas se tornaram chagas abertas que perpassam e sangram a Amazônia de fora a fora, causando cada dia mais vítimas fatais.
As prioridades da ação pastoral e evangelizadora apontadas em 1972 continuam atualíssimas. Até hoje uma formação adequada à essa região para ministros ordenados, mas também para leigas e leigos que dirigem as comunidades, é fundamental. Importa encarnar a Igreja no chão concreto da Amazônia. Quem exerce um ministério, ordenado ou não, participa do pastoreio de Jesus e está a serviço de seus irmãos e irmãs e quer exercê-lo na simplicidade do lava-pés e numa proximidade fraterna ao Povo de Deus.
As Comunidades Cristãs ou Eclesiais de Base tão recomendadas no Documento Santarém 1972 são expressão de uma Igreja viva e comprometida. Como os bispos já afirmaram em Manaus (2007), elas constituem um dom especial que Deus concedeu à Igreja na Amazônia. São obra do Espírito Santo. O que o Documento de Aparecida afirma, aplica-se de modo especial à Amazônia. As CEBs, diz o documento, “têm sido escolas que têm ajudado a formar cristãos comprometidos com sua fé, discípulos e missionários do Senhor, como o testemunha a entrega generosa, até derramar o sangue, de muitos de seus membros” (DAp 178). As CEB’s são também uma resposta válida e empolgante para o mundo urbano como resposta ao individualismo e a superficialidade do consumismo. Nas CEBs se vive a dimensão samaritana da compaixão ativa e interajuda, de um coração e mãos abertas para quem sofre ou passa necessidade, mas também a dimensão profética de anunciar continuamente a utopia do Reino e, ao mesmo tempo, denunciar todos os mecanismos e estruturas que impedem a chegada do Reino. É exatamente esta dimensão profética que gerou as e os mártires da Amazônia. As CEBs constituem-se em família das famílias onde todos se conhecem e querem bem, mas são também centros de oração e meditação da Palavra de Deus para nutrir a mística profunda da vivência na proximidade de Deus. Ele mesmo se revelou como um Deus-conosco e assegurou aos profetas, apóstolos, discípulas e discípulos: “Eu estarei contigo“ (cf. Ex 3,14; Js 1,9; Jr 1,19; At 18,9-10). Afinal “se Deus está conosco, quem será contra nós“ (Rom 8,31).
Santarém 1972 assume a questão indígena como causa de toda a Igreja na Amazônia. Lembra que no mesmo ano por iniciativa dos bispos, mormente dos da Amazônia, foi fundado o Conselho Indigenista Missionário – Cimi.
Os bispos talvez não imaginavam quarenta anos atrás o imenso apoio que sua decisão significava aos direitos e à sobrevivência de dezenas de povos indígenas na região amazônica que, sem o empenho intransigente da Igreja, teriam desaparecido. A presença solidária e o apoio incondicional à luta por seus direitos foi fundamental para que hoje a maioria dos povos indígenas da região tenha suas terras demarcadas. Foi também de enorme importância gerar uma consciência de respeito e valorização dos povos, suas culturas e seus projetos de “Bem Viver“. Dezenas de povos saíram do silêncio em que foram forçados a se ocultar para sobreviver. Ressurgiram das cinzas e estão lutando pelos seus direitos e suas terras. Alem disso a atuação corajosa dos missionários, selando seu compromisso através do sangue derramado pela vida desses povos, propiciou o surgimento de articulações e organizações dos povos indígenas, essenciais para a conquista de seus direitos e sua autonomia.
Os riscos de extermínio de vários grupos indígenas em estado de isolamento voluntário, exige um renovado compromisso com a sobrevivência de milhares de vidas e povos ameaçados de extinção.
Na perseverança salvareis vossas vidas (Lc 21,19)
Deparamo-nos hoje com uma verdadeira enxurrada de grandes projetos que os Governos querem implantar, seguindo a estratégia do “fato consumado“. Não há discussão, nem consulta popular que merecesse este nome. Decide-se e executa-se. Oponentes são criminalizados ou taxados de inimigos do progresso. Também os ribeirinhos, seringueiros, quilombolas, e outros povos tradicionais sofrem pela falta de recohnecdimento de suas terras.
A ética na política prometida à nação e esperada pelo povo brasileiro cedeu lugar a uma sequencia ininterrupta de escândalos de corrupção em todos os níveis governamentais.
            Somado a estes desafios nos deparamos com a emergência do fenômeno urbano, com o inchaço nas periferias das grandes cidade, exploração sexual, tráfico de pessoas e de drogas, violência. Em vez de investimentos em políticas públicas de saneamento básico, saúde, educação e segurança, o Estado prioriza políticas compensatórias, apoia e incentiva o grande capital, investe na construção de estádios monumentais e outras obras faraônicas.
“Podem roubar-nos tudo, menos a esperança” (D. Pedro Casaldáliga). No caminho de “Santarém”, novamente nos lançamos nas estradas e rios, nas aldeias e quilombos, nos interiores e periferias das cidades, nos grandes centros urbanos desta imensa Amazônia, abraçando a Missão que nos foi confiada, comprometidos com toda a criação e na busca de sermos autênticas comunidades de fé alimentadas pela Palavra e pela Eucaristia. Nesta hora da história o nosso coração às vezes, se angustia por causa de tantas dificuldades que nos desafiam, aparentemente insuperáveis; no entanto, continuamos a ser chamados e enviados como missionários e profetas para alimentar a esperança, como âncora firme e segura (cf Hb 6,19), de um mundo novo, inaugurado por Jesus Cristo Crucificado e Ressuscitado.

Por Joelma Viana, Ercio Santos, Everaldo Cordeiro, Ormano Sousa.